A comunicação de causas e a comunicação periférica dão match?

Por Cristina Fernandes

Se a ideia é promover transformação social, sim, comunicação de causas e comunicação periférica têm tudo para dar certo e virar um relacionamento longo e duradouro. 

A comunicação de causas tem a ver com a comunicação produzida ou apoiada por fundações e institutos ligados à iniciativas privada cujo foco de atuação é o bem público – educação, cultura, meio ambiente, infância, equidade racial, desenvolvimento local… e também as ações de comunicação voltadas para o social apoiadas por empresas como forma de dar concretude ao seu compromisso com a sociedade. Na maioria, o objetivo principal é a melhoria da qualidade de vida das populações de baixa renda ou em situação de vulnerabilidade. 

Já a comunicação periférica, jornalismo das periferias ou jornalismo das quebradas (esse é o nome que mais gosto pela autenticidade) é aquela desenvolvida pelos comunicadores das periferias, sobre as questões que afetam suas comunidades, que diz respeito aos direitos das pessoas que habitam os territórios periféricos. Que direitos são esses? Educação, cultura, meio ambiente, infância, equidade racial, desenvolvimento comunitário…

É nessa encruzilhada que a comunicação de causas encontra a comunicação periférica. Ambas as comunicações atuam pelo mesmo objetivo – melhorar as condições de vida das famílias de baixa renda, principalmente, as que vivem nas periferias das grandes cidades, cujos direitos sociais raramente são garantidos. É aqui que se encontra o ponto em comum e a enorme potência desse encontro, elas atuam pelas mesmas causas. 

No entanto, muitas são as diferenças de condições de produção entre esses dois campos da comunicação.  

Quem faz comunicação periférica, afinal?

No final de agosto foi lançada a pesquisa “Mapa do Jornalismo Periférico: passado, presente e futuro”, produzida pelo Fórum de Comunicação e Territórios, uma coalizão entre os coletivos Desenrola e Não Me Enrola, Periferia em Movimento, Historiorama, Preto Império, Gisele Brito e Mariana Belmont, coletivos e profissionais de comunicação originários e atuantes nas periferias de São Paulo, com apoio da Fundação Rosa Luxemburgo.

Com o objetivo de identificar, conhecer e entender como funcionam, o grupo mapeou 97 iniciativas de jornalismo periférico que atuam nas regiões periféricas da cidade de São Paulo. 56 iniciativas responderam a um questionário online, 20 representantes foram entrevistados presencialmente e 30 participaram de um encontro coletivo para aprofundar as perguntas da pesquisa.

O Fórum Comunicação e Territórios conseguiu traçar um pouco da história desse movimento, identificando que no início dos anos 1990, jornais impressos, fanzines e rádios disputavam o direito à comunicação nos territórios periféricos de São Paulo. Entretanto, foi a partir de 2012 que se registrou uma ascensão desse movimento, com a criação de 36 novas iniciativas. 

Há bastante história e estudos sobre esse campo da comunicação, mas o que é importante destacar aqui cabe em uma palavra: resistência. 

Essas iniciativas sobrevivem como resultado de muita luta, persistência, trabalho voluntário de jovens estudantes e profissionais experientes dedicados que acreditam que a comunicação é um direito e tem o poder de informar, educar e transformar realidades. 

Os parcos recursos advêm dos editais de cultura da prefeitura que estão cada dia mais raros. A maioria se mantém com recursos escassos que mal cobrem os custos da energia elétrica.

 Se por um lado há escassez de recursos, por outro há abundância de talento, criatividade e dedicação para produzir uma comunicação que engaja e mobiliza as comunidades e tem potência de transformação. 

Os comunicadores das periferias são os melhores editores para produzir conteúdos que tenha relevância, na linguagem mais apropriada e no formato mais adequado para falar com as suas comunidades. São editores com legitimidade para mobilizar. 

Nada sobre nós sem nós

São os jornalistas e comunicadores da periferia que, sobretudo, conhecem os problemas sociais porque eles vivem isso no seu cotidiano. São eles e toda a sua comunidade que sofrem com a baixa qualidade da educação, com a falta de apoio para a cultura local, com o desemprego, com o racismo, com a falta de creche e tudo mais. 

Para uma comunicação efetiva, a mensagem precisa ser transmitida por alguém representativo da comunidade ou do setor. Os jornalistas periféricos têm credibilidade porque fazem parte do território e possuem domínio do vocabulário local para que a mensagem seja facilmente assimilada. Eles sabem, melhor que ninguém, explicar as coisas para as famílias, se comunicar com o pai e com a mãe, com os amigos e vizinhos. 

As pessoas possuem conhecimentos que precisam ser valorizados e querem fazer parte da solução. E, mais importante, as pessoas querem produzir suas próprias narrativas. 

Portanto, comunicadores de causas, que tal marcar um encontro com comunicadores periféricos, para darem início a um relacionamento genuíno, baseado na confiança e na admiração recíproca com o objetivo de produzir uma comunicação transformadora. Quer conhecer mais? Dá uma olhada no Mapa do Jornalismo Periférico. Não é um Tinder, mas pode ajudar. 

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